A CASA DOS ESPÍRITOS – ISABEL ALLENDE

quinta-feira, julho 25, 2024

 


 

Desde que comecei minha saga literária de ter uma biblioteca particular, sempre cuidei dos meus livros para que não sujassem, manchassem, dobrassem, riscassem, além de não emprestar para ninguém, nem mesmo para a minha mãe. Mas desde que entrei nos clubes dos livros há alguns meses, senti a necessidade de marcar as passagens que mexiam comigo e que eu achava sim importantes para as narrativas. “A casa dos espíritos” foi o que mais grifei, e só não destaqueis mais passagens porque acabaria riscando o livro inteiro. É, Isabel, você realmente me deixou com ressaca literária!

 

Livro de estreia da chilena Isabel Allende, “A casa dos espíritos” foi publicado em 1982 e até hoje emociona os leitores. Acompanhamos a saga emblemática da família Trueba e o relato de um período turbulento na história do Chile. Antes de começar a ler a obra, acreditava que a história daria ênfase aos espíritos, mas é mais do que isso, é sobre a delicadeza de narrar o sofrimento de um povo, principalmente as mulheres, que lutam diariamente para tentar sobreviver à pobreza, ao poder, à ditadura.

 

Esteban Trueba não era o que se considerava um bom rapaz, não tinha fortuna e possuía um futuro incerto pela frente. Hipnotizado, como todos, com aquela aparição que congestionava o tráfego, ao ver aquele cabelo verde que emoldurava o rosto de Rosa, Esteban decidiu que apesar de não ser o pretendente ideal, ela era a única mulher digna de ser sua esposa, e se não a pudesse ter preferia ficar solteiro, e com a ajuda da irmã se aproximou da família Del Valle. Apesar de uma beleza inumana e de encantar a todos, Rosa não tinha pretendentes, e Esteban se tornou seu noivo sem ter de realizar nenhuma proeza.

 

Focado em se tornar um homem de posses e também garantir o futuro de sua família, Esteban decide arriscar nas minas de ouro e prata, que era o grande sonho dos aventureiros, podendo afundá-los na miséria, matá-los de tuberculose ou torná-los homens poderosos. Um dia, Trueba recebe um telegrama de sua irmã anunciando a morte prematura e erroneamente de Rosa graças a uma garrafada envenenada destinada a seu pai.

 

Em meio ao seu desespero, Esteban praguejou, irritado por ter dado a vida nas minas de ouro por Rosa e ela simplesmente fugir-lhe das mãos. Naquela noite, Esteban pensou que perdera para sempre a capacidade de se apaixonar, mas “para sempre” é muito tempo.

 

Após tamanha desilusão causada pelo destino, Trueba decide partir para as terras abandonadas de seu pai, deixando na capital sua irmã que cuida de sua mãe debilitada. Com muito trabalho e dedicação, Trueba transformou Las Três Marias em uma fazenda modelo e em dez anos conseguiu ver o sucesso bater à sua porta. Dono de tantas terras, Esteban acreditava ser o melhor patrão da região, que sem ele, seus empregados ainda estariam passando fome.

 

Com o poder dominando seu bom senso e também graças ao seu gênio ruim, nada impedia aquele homem, em cima de seu cavalo, de pegar a primeira menina de 15 anos na sua frente, derrubá-la no meio do mato e atacá-la com brutalidade. Não foi apenas um caso isolado, mas inúmeros! Os pais e irmãos das jovens não tinham coragem de enfrentar o patrão depois que um homem de outra fazenda foi encontrado morto. Assim, sua fama cresceu, e o poder que lhe subiu à cabeça o fazia acreditar ser dono também daquelas pessoas.

 

Quando sua irmã envia um telegrama informando que a saúde de sua mãe piorou, Esteban finalmente volta para a cidade a fim de se despedir daquela mulher que ele não tinha muitas lembranças boas. Após fazer o filho jurar em seu leito de morte que se casaria com uma boa mulher, ela se vai em paz e entregue ao alívio. Ciente de que a família de sua amada Rosa o aceitaria novamente, decidiu ir à casa dos Del Valle encontrar uma noiva, com certeza eles, com tantos filhos, teriam alguma moça à sua altura. Mal sabia Esteban que a pequena Clara agora era uma linda moça e já havia previsto o seu casamento com o ex-noivo de sua irmã.

 

Clara era uma menina especial, era clarividente e tinha os espíritos como amigos que a acompanhavam. Na mesa durante o jantar, a mãe precisava controlar a filha mais nova, principalmente na frente das visitas, para a menina não tirar um saleiro do lugar com a mente ou mesmo levitar.

 

Com a trágica morte de sua irmã por envenenamento, Clara viu, escondida, a pior cena que poderia ver e que carregaria para o resto da vida: o médico da família fazendo a autópsia do corpo de Rosa em cima da mesa da cozinha e o médico assistente, em uma atitude um tanto mórbida, beijando todo aquele corpo nu, já limpo por ele, idolatrando aquela que todos na cidade acreditavam ser imortal. Após o fatídico dia, Clara não falou mais, durante dez anos, mesmo com as tentativas insistentes de Nana lhe pregar peças e assustar, todas em vão.

 

Clara só voltou a falar no dia em que comunicou aos pais que se casaria com Esteban, tornando real a premonição dos espíritos meses depois. A moça já havia aceitado o seu destino, mesmo sabendo que não se casaria por amor. No entanto Esteban, contrariando a opinião de que jamais se apaixonaria por outra após a morte prematura de Rosa, se viu completamente encantado pela beleza de Clara, e mal sabia ele que daquele até o último dia de sua vida, ele faria de tudo para possuir aquela mulher que jamais seria totalmente sua. Com o casamento, Esteban constrói a casa da esquina para Clara, o lugar que com o tempo, seria abrigo e ponto de encontro de pessoas necessitadas, de espíritos, de amigos, de inimigos.

 

Clara manteve por cinquenta anos vários diários que chamava de “cadernos de anotar a vida”, separados por acontecimentos e não por ordem cronológica. Logo, as pessoas não poderiam ter nomes iguais já que causaria confusão nos cadernos. O casal Trueba teve três filhos: a primogênita Blanca, uma mulher ardente, obstinada e com uma beleza luminosa, que manteve desde a sua primeira infância um amor arrebatador pelo filho do capataz de seu pai, e que passa a ser desprezada por Esteban depois que ele flagra os dois se encontrando à noite, escondidos, nas margens do rio, ocasionando no nascimento de Alba, a única neta do casal e a adoração de Esteban.

 

Os gêmeos Jaime e Nicolás viviam juntos até a adolescência e quando um se metia em confusão, era o outro que comprava a briga. Mas no começo da fase adulta os dois se separaram, com seus interesses nada em comum. Jaime entrara para a universidade e se transformaria no médico que mais ajudaria a população pobre, enquanto Nicolás vagaria por toda a vida procurando um destino.

 

A obra é cheia de detalhes e Allende narra com delicadeza a vida das três gerações da família Trueba, a construção do amor de Esteban por Clara, os nascimentos conturbados dos três filhos, as crianças crescendo e o pai percebendo que nenhum deles tinha os mesmos objetivos que os seus, a decepção do rei das terras ao ver sua filha se relacionar com o filho de um empregado que pregava uma linha política e lutava a favor dos direitos dos trabalhadores, a gravidez de sua filha que resultou no afastamento e silêncio total de Clara com o marido, da perda do amor dos filhos pelo pai, que sempre julgou ao invés de apoiar e orientar, os trabalhos espirituais de Clara e de sua ajuda humanitária com os pobres e necessitados, o surgimento da ditadura no país, em 1973, e da destruição que o próprio Esteban acabou ajudando a criar, perdendo sua família e o levando a cada dia para mais perto de sua morte.

 

Não teve um momento durante a leitura que não me revoltei, que não me emocionei, que as lágrimas não rolaram seja por nervoso ou por angústia, que consegui simplesmente não sentir absolutamente nada. Isabel Allende construiu personagens incríveis para narrar uma história de ficção, mas que tem como base fatos reais de seu país, inclusive da história de sua própria família, já que Salvador Allende, o presidente eleito democraticamente pelo povo, que governou o Chile de 1970 a 1973, e assassinado após o golpe de estado liderado por Augusto Pinochet, em 11 de setembro de 1973, era irmão de seu pai, o diplomata Tomás Allende.

 

“A casa dos espíritos” é um dos romances que, na minha opinião, deveria ser uma leitura obrigatória. A obra também serviu de inspiração para o filme com o mesmo título, lançado em 1993, com Meryl Streep, Glenn Close, Winona Ryder e Antonio Banderas e que é simplesmente maravilhoso.

 

E você, já leu essa história ou alguma obra de Isabel Allende?

Me conta nos comentários!

Espero que tenha gostado! A gente se vê no próximo post, até lá!

 

A CASA DOS ESPÍRITOS

PÁGINAS: 448

AUTOR: ISABEL ALLENDE

EDITORA: BERTRAND BRASIL

 

 

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