Lolita – Vladimir Nabokov

quinta-feira, junho 20, 2019




Aquele livro de capa azul com a imagem das pernas de uma menina usando meia 3/4, típica colegial de um colégio interno, sempre me deixou intrigada. O livro chegou em casa no mesmo ano que foi publicado pela Folha, em 2003. Na época eu tinha 13 anos, e hoje eu dou graças a Deus por não ter tido curiosidade suficiente para abrir as suas páginas.

Um dos clássicos da literatura do século 20, “Lolita” foi considerado em sua época uma obra destinada ao escândalo, que incitava a pornografia infantil, vulgar, erótico e libidinoso.  Devido a essas críticas, agradeço a experiência de mundo que tenho hoje para enfim tê-lo finalizado e poder então dar minha opinião sobre o contexto.

Em suas últimas páginas, uma nota do próprio autor falando sobre a obra, traduz muito do meu sentimento quanto à narrativa. Ri sozinha quando li seu texto tão óbvia era a reação dos leitores. Depois disso, minha visão crítica mudou quanto à obra num todo, mas os detalhes ainda repercutem minha opinião.

O que dizer do obsessivo professor universitário de meia-idade, Humbert Humbert, um homem que deseja com fervor e faz de tudo para possuir aquilo que quer? Dependendo do contexto, posso dizer que é nojento e revoltante, visto que o objeto de posse é uma menina de 12 anos.

“Lolita” pode sim ser considerado um romance típico, quando a idade não vem à tona. Afinal de contas, quando estamos apaixonados somos capazes de muitas coisas para conquistar o coração e a atenção de quem amamos.

Narrado em primeira pessoa, a obra é o diário de Humbert, que está aguardando seu julgamento após ser acusado de assassinato. Enquanto espera ele decide escrever aos jurados a sua versão da história e começa a reviver os dias que passou ao lado de sua Lolita e todos os truques que usou para conquistá-la.

Humbert conta que, Lolita começou com Annabel, uma menina por quem foi apaixonado quando ainda era uma criança. Descobrindo juntos uma paixão inocente, o desejo cresceu aos poucos, dando lugar a encontros escondidos onde tocar lugares proibidos era permitido. Essa sede por um corpo novo, ainda em desenvolvimento, tomou conta dos sentimentos mais profundos de Humbert até a fase adulta.

Com sua chegada aos Estados Unidos, em 1940, vindo da França após um casamento catastrófico, Humbert assume os negócios de um tio. Passava os dias no Central Park vendo ninfetas brincarem, se divertindo apenas em observá-las. E como era detalhista, nosso personagem! Após uma depressão profunda e um período em um sanatório, seu médico recomendou que uma vida ao ar livre pudesse lhe trazer alguns benefícios.

Assim, Humbert parte em uma expedição para regiões árticas do Canadá. Mas ao voltar para a civilização, um novo acesso de insanidade toma conta do professor. A fim de procurar algum lugar mais calmo para poder voltar a escrever, Humbert chega a uma pequena cidade no interior da Nova Inglaterra, e enfim conhece a sua Lolita.

A visão da menina faz Humbert voltar no tempo e buscar Annabel, e aquele desejo que ficou insaciável na infância vem à tona. Os dias que passa como inquilino na casa da mãe de Dolores – Dolly, Lolita, Lola, Lô – são propícios para que cresça a paixão que Humbert sentiu quando viu Dolly pela primeira vez.

A partir daí os leitores acompanham a saga de um homem tentando aproveitar cada segundo ao lado da menina para seduzi-la. Apesar de ser considerada uma obra pornográfica, a narrativa não tem nada explícito. Há inocência por parte de Dolly, que trata Humbert como “um homem qualquer”. Órfã de pai, a menina briga pelas tirinhas de seu jornal, se interessa pelas suas anotações e seu trabalho, e mantém uma paixão de menina, escondida, pelo homem mais velho que habita sua casa.

Humbert é considerado um pedófilo, visto que abusava de uma menina de 12 anos, fisicamente e psicologicamente. Mas a menina não era tão inocente assim, já que havia muito mais malícia em suas atitudes. Depois de muita insistência o romance é consentido, e o casal passa a percorrer os Estados Unidos em uma viagem de amor, de descoberta, de atitudes infantis (afinal de contas ela é uma menina, que está em fase de crescimento e tem a sua rotina alterada), de uma conquista diária a qual Humbert se submete para ter seus caprichos pedófilos satisfeitos.

A linguagem usada na narrativa me cansou em praticamente todas as páginas. Muitas vezes Humbert é um maluco, desaforado, que julga e condena demais as pessoas que não gosta. E foi isso que me fez não sentir um pingo de empatia por ele – e não exclusivamente suas atitudes pedófilas. Ele usa ainda citações clássicas demais, o que me fez ficar perdida, porém não deixa de ser um personagem inteligente já que é um professor universitário de literatura. Como bom francês, o personagem adota em suas páginas frases francesas, o que também acaba confundindo o leitor que não domina a língua.

Levando em conta os detalhes, não recomendo a leitura. Finalizei “Lolita” por insistência própria, visto que minha curiosidade não tomava mais conta de mim desde as primeiras páginas – o mesmo aconteceu com muitos leitores. O que irrita é a obsessão do personagem de acreditar cegamente que ele é único, que Dolly nunca vai crescer e vai preservar o seu corpo de menina/ninfeta, que ela nunca vai querer ter outra vida a não ser a que tem com ele e que ele é um santo.

É revoltante quando Humbert obriga Lolita a ficar com ele, ameaçando a menina, dizendo que se ela não se comportar ou chegar a denunciar ele, ela vai parar em alguma instituição ou reformatório para meninas; um louco que acredita que não seduziu a menina, mas que ela é quem o seduziu, por isso suas atitudes são “santas” e justificáveis; quando ele é contra ela ter amizades – as meninas nunca são boas o suficiente, sempre gordas, ou feias, ou com a cara cheia de espinha –, e quando ele ameaça todo e qualquer rapaz que troca poucas palavras com Lolita.

Lolita é sua, lhe pertence, por isso é proibida de ter contato com qualquer um que a tire dele. Seus dias devem pertencer a ele, tanto que o louco a persegue mesmo quando ela está na escola.

Vendo a obra como um todo, recomendo a leitura. É preciso quebrar tabus e críticas, é preciso criar a sua própria opinião através da sua perspectiva. Particularmente nunca conheci ninguém que tenha lido “Lolita”, mas como a própria obra foi “acusada” de opiniões controvérsias, fica a dica para você, mais uma vez, ler e tirar suas próprias conclusões.

Acredito que, para a época, “Lolita” deve mesmo ter dado o que falar. Por isso retomo a minha afirmação no começo dessa crítica que, ainda bem que a obra “caiu em minhas mãos” hoje, quando já tenho opiniões formadas quanto ao mundo. Se a menina de 13 anos tivesse lido a narrativa, com certeza ela estaria traumatizada, por assim dizer, até hoje.

É preciso estar preparado para o mundo. É preciso ter consciência de que tudo é maior do que pensamos. É preciso ter a malícia e compreender que muitas coisas estão fora do nosso entendimento. Mesmo quando uma obra de ficção cai em nossas mãos, muitas vezes ela foi inspirada por fatos reais.

Espero que você leve em conta a sua própria curiosidade e não use a minha opinião como única verdade. Apesar do meu sentimento quanto à obra ser bipolar – uma hora eu gostei, na outra eu detestei – recomendo sim a leitura. Afinal de contas, nada melhor do que um clássico aclamado para nos fazer evoluir.

LOLITA
AUTOR: VLADIMIR NABOKOV
EDITORA: FOLHA DE S. PAULO
PÁGINAS: 320

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