TEMPO DE GRAÇA, TEMPO DE DOR – FRANCES DE PONTES PEEBLES

quinta-feira, junho 15, 2023

 


 

Egoísta, mesquinha, exibida, invejosa, orgulhosa, mimada. Esses são apenas alguns adjetivos que consigo dar para uma das personagens de “Tempo de Graça, Tempo de Dor”, de Frances de Pontes Peebles. Essa narrativa chegou até mim por causa da sua capa, que me conquistou e me atraiu, ler a sinopse me deixou mais curiosa.

 

Das Dores é uma menina nascida na miséria e órfã de mãe, que trabalha na cozinha de um grande engenho de açúcar, em Pernambuco, nos anos 1930. Criada pela cozinheira, Nena, após sobreviver ao próprio nascimento, foi a última de cinco filhos há muito desaparecidos. Com uma vida muito sofrida, os empregados da fazenda apenas falavam de sua mãe para lhe insultar, e com a morte da mãe no parto, a parteira resolveu entregar a criança a Nena, por ela ser tão saudável, ao invés de sufocá-la e jogá-la no canavial para os urubus. Seu apelido, grosseiramente dado pelos empregados, era Jega, pois foi graças ao leite de uma jega que a criança conseguiu ficar forte e engordar.

 

Um dia, a chegada da família Pimentel ao engenho muda completamente a vida na fazenda. Graça, a filha mimada do novo senhor do Riacho Doce, é esperta, bem alimentada, bonita, e malcomportada. Criadas em mundos completamente opostos, Das Dores e Graça constroem uma amizade que nasce das travessuras feitas em dupla. Por não ter irmãos e nem com quem brincar, Das Dores passa a frequentar os mesmos ambientes que a “patroinha” dentro da casa-grande, assistindo às aulas que Graça também assistia em casa e se destacando por ter maior facilidade em aprender as coisas.

 

Quando dona Aurora decide levar a filha e Das Dores para o Recife para assistirem a uma apresentação de ópera, floresce nas meninas seu amor pela música, algo que por muitos anos seria impossível de decifrar, marcando para sempre suas vidas e seus destinos. Fugindo durante as noites da casa-grande para xeretar as rodas de música dos empregados do engenho, as meninas descobririam, após muitos anos, o quanto aquilo seria importante para elas.

 

Muitas coisas acontecem no Riacho Doce até chegarmos a esse ponto da história, e quando começam a enxergar o que o futuro no engenho reserva a elas, Graça e Das Dores fogem para o Rio de Janeiro com o sonho de conquistar uma carreira como divas do rádio. Mas só uma delas está destinada a se tornar uma estrela, para a outra restará os bastidores, longe das atenções e do reconhecimento do público.

 

Começando pelo Nordeste, passando pelas ruas da Lapa, no Rio de Janeiro, e pela Los Angeles da “Era de Ouro” hollywoodiana, falando sobre o samba e a fantasia do cinema, “Tempo de Graça, Tempo de Dor” é o comovente retrato de uma amizade inabalável, marcada pelo orgulho, pela rivalidade e pelo ressentimento. Narrado por Das Dores em formato de memórias, ela conta as alegrias e o lado sombrio do relacionamento de duas mulheres que encontram na música, e às vezes uma na outra, o sentido da própria existência.

 

Fazendo minha crítica à obra, que me encantou por muito motivos, principalmente pela estruturação histórica do Brasil e do mundo, e também pela delicadeza de Peebles ao narrar a vida sofrida dessas duas meninas, mas que me deixou muito mais revoltada com a leitura por desejar mais coisas boas para Das Dores.

 

Compreendo que Graça e Das Dores são muito amigas e até mais do que isso, dependendo da interpretação, mas Graça é muito egoísta e Das Dores é muito submissa a ela. Graça não sabe se virar sem Das Dores, mostrando o quanto é “patroinha” e dependente, e que nunca se importou com os sentimentos de Das Dores a não ser para o seu próprio mérito. Esse foi um ponto que me deixou extremamente irritada. Uma amizade pode sim moldar a nossa vida e a nossa personalidade e sei o quanto ter amigos e construir essa relação por anos a fio é importante, principalmente na vida adulta, mas ela deve ser um caminho de mão dupla e, na minha opinião, como em qualquer relacionamento, quando não é dado o devido valor que você tem, é preciso pular fora.

 

Uma das cenas narradas que me irritaram demais é quando a "bonequinha" invade uma roda de samba que Das Dores faz parte, sem ser convidada pelos integrantes, e simplesmente começa a mandar nela, como se fosse dona de tudo, a "patroinha" do lugar. Finalizo dizendo que, para mim, Graça é a famosa mala sem alça. Nunca soube o que é ser humilde e, apesar de ter tido uma vida tão sofrida quanto Das Dores, mas de formas diferentes, nada justifica o pouco caso com que ela tratava sua amiga que era mais do que uma irmã.

 

Da mesma forma, acredito que Das Dores também era dependente de Graça, e nunca foi por status ou dinheiro, talvez tenha sido apenas pelo mais puro e verdadeiro amor, mas que deveria ter feito ela se colocar em primeiro lugar antes de colocar Graça em um pedestal e jamais tirá-la de lá.


TEMPO DE GRAÇA, TEMPO DE DOR

PÁGINAS: 368

AUTOR: FRANCES DE PONTES PEEBLES

EDITORA: ARQUEIRO

 

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